sábado, 15 de novembro de 2008

Economia impulsiona apoio à democracia na América Latina

Fonte: Folha de São Paulo


Economia impulsiona apoio à democracia na América Latina
Respaldo ao sistema na região, de 57%, é o maior desde 1997, mostra Latinobarómetro; crise global pode abalar confiança


Apesar de 53% dizerem que aceitariam ditadura caso ela melhorasse economia, instituto chileno não vê risco de recaída autoritária

FLÁVIA MARREIRO
DA REPORTAGEM LOCAL

A América Latina reflete a bonança econômica dos últimos cinco anos -combinada a um processo de relegitimação da política- em índices de apoio à democracia e bom humor: 57% da população da região acha que o regime democrático é o melhor, contabilizadas as imperfeições, e nada menos do que 71% se dizem felizes.
Essa é a fotografia geral dos países do subcontinente captada pela ONG chilena Latinobarómetro, clicada enquanto a crise nos EUA ainda começava a se aprofundar, praticamente decretando o fim de um ciclo tão positivo. Foram feitas 20.204 entrevistas entre 1º de setembro e 11 de outubro, numa amostra dos mais de 500 milhões de latino-americanos.
É o 13º ano da pesquisa, e o apoio à democracia só perde para o índice de 1997 -outro momento de ascensão econômica-, quando alcançou 63%. Em relação a 2007, o respaldo à democracia avançou três pontos percentuais.
Não é novidade a vinculação entre democracia e economia na região. O ponto mais baixo do apoio na série é em 2001, ainda sob impacto da crise asiática. Os números mostram que tempos de vacas magras causam mais dano à taxa pró-democracia do que o ciclo de bonança é capaz de impulsioná-la, daí a preocupação da diretora do Latinobarómetro, Marta Lagos, com o cenário vindouro.
"A pesquisa mostra que a população não está de nenhuma forma informada sobre a crise. É preciso que ela saiba que o mundo está entrando em recessão, que pode ser prolongada. É dever dos líderes informar", disse ela à Folha.

Além da economia
O casamento entre humor econômico e democracia também fica claro quando 53% do subcontinente respondeu que toparia viver sob uma ditadura caso ela fosse capaz de resolver os problemas econômicos.
Mas o próprio Latinobarómetro minimiza previsões de solavancos nos regimes democráticos quando a queda no preço das commodities, petróleo incluído, esvaziar para valer os caixas governamentais.
O instituto diz que o amadurecimento democrático representa "de maneira simultânea a consolidação da democracia social, política e econômica".
É a combinação desses fatores que explica, por exemplo, o salto do Paraguai em todos os rankings após a eleição do bispo esquerdista Fernando Lugo, depois de 61 anos de regime conservador. Num dos países mais pobres da região, o apoio à democracia avançou 20 pontos percentuais entre 2007 e 2008. São otimistas: 78% acham que 2009 vai ser melhor.
Num dos pontos mais baixos da lista está o Peru -8% de avanço do PIB no período-, onde só 45% apóiam a democracia, mostrando que importa a sensação de distribuição do bolo. Só 8% acham que o governo Alan García "é para o bem de todos" e 22% acham que o país vai melhorar em 2009.

Assim caminha
Para reforçar a tese de que, apesar dos 53% que dizem que tolerariam uma ditadura, a região não sofre risco de regressão autoritária, o Latinobarómetro lembra que, em situações reais onde os países poderiam ter se inclinado a essas soluções, como na Bolívia, vingou a opção democrática.
As populações veriam a instabilidade política em países como Bolívia e Equador como sinal de mobilidade do sistema e um passo até "sociedades mais democráticas".
A fé de que o voto pode mudar as coisas move 59% dos latino-americanos e retrata o momento das democracias na Venezuela e no Chile. Apesar do hiperpresidencialismo chavista, 80% dos venezuelanos acham isso. "A Venezuela vive um momento de definição, em especial depois do referendo da Constituição [que Chávez perdeu]. O país apóia a democracia, mas está divido sobre qual democracia quer", diz Lagos.
Já o Chile, com o desgaste de 18 anos de governo de centro-esquerda, é o campeão no índice dos que dizem que não é possível gerar mudanças: 27%. "A situaçã no Chile pode favorecer a oposição no ano que vem, mas a crise é mais profunda. É de representação. Um em cada cinco chilenos não foi votar nas eleições municipais em outubro. É o índice mais baixo desde a volta de democracia", completa.

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