terça-feira, 13 de janeiro de 2009

Erradicação do Trabalho Infantil tem R$ 54 milhões a menos este ano

Fonte: 24horasnews.com.br

Cantigas de roda, cirandas e brincadeiras. Cerca de 4,8 milhões de crianças e adolescentes entre 5 e 17 anos não sabem muito bem o que isto significa. Ao invés de cantarolarem O cravo e a Rosa, Marcha Soldado ou Ciranda Cirandinha, estão em carvoarias, canaviais, pedreiras, semáforos e centros urbanos ajudando a completar a renda familiar. A Constituição Federal, por meio do artigo 227, assegura à criança e ao adolescente o acesso a programas assistenciais e os coloca a salvos de toda e qualquer forma de exploração, violência e opressão. Contudo, o programa de Erradicação do Trabalho Infantil (PETI), tocado pelo Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS), teve sua verba reduzida em R$ 54,5 milhões este ano.

Em 2008, o Orçamento Geral da União apontava R$ 335,8 milhões para o desenvolvimento de ações de combate e prevenção a qualquer forma de trabalho de crianças e adolescentes com idade inferior a 16 anos, exclusive na condição de aprendiz para aqueles entre 14 e 15 anos. Já no orçamento 2009 aprovado no Congresso Nacional no final do ano passado, a dotação é de R$ 281,3 milhões, isto é, um decréscimo de 16% sobre o montante de recursos previstos ao programa em 2008.

A diretora do Departamento de Proteção Social Especial do MDS, Valéria Gonelli, justifica que não só o PETI, mas vários programas federais foram atingidos com cortes no orçamento. “Nós já estamos tratando com o Ministério do Planejamento para tentar recompor o orçamento que apresentamos no plano orçamentário anual, que era de R$ 346,8 milhões”, pondera.

Mas para o coordenador do programa da Save the Cildren Reino Unido no Brasil, organização não-governamental internacional que promove os direitos da infância, Guilhermo Navas, é preciso constatar a prioridade da criança no orçamento. “Se tem diminuído verba é preciso que estejamos atentos para verificarmos se o direito à proteção as crianças está sendo afetado”, alerta. Navas ressalta que todo o ciclo orçamentário deve ser analisado. “A execução do programa não está em um nível satisfatório, por isso, é preciso o monitoramento final, além da atenção para os recursos que foram aprovados ao programa”, justifica.

Todavia, a diretora Valéria Gonelli lembra que o desenvolvimento das ações do programa, bem como a aplicação da verba, muitas vezes é comprometido pela falta de empenho dos estados e municípios. “Por isso, trabalhamos com estimativas e, como se pode observar, ao fim dos anos tem havido uma sobra de recursos”, lamenta. “Mas este ano vamos trabalhar com recursos mais factíveis, só que continuaremos com as tentativas [de ampliar a verba] no Ministério do Planejamento”, atesta.

Cai número de beneficiários

Além da queda nos recursos orçamentários, a meta do governo federal em atender as crianças e aos adolescentes com as ações do programa Erradicação do Trabalho Infantil também diminuiu. Para 2008, a intenção do MDS era fiscalizar e regularizar a situação de trabalho de 34.042 crianças e adolescentes. Este ano, de acordo com a redação final do orçamento aprovado no Congresso, a previsão do ministério é atender 22.500. As ações sócio-educativas e de convivência para aqueles em situação de trabalho devem atender 828.579 crianças e adolescentes este ano. O número representa apenas 17% daqueles em situação de trabalho no país. Em 2008, a previsão era beneficiar 1.360.124 meninos e meninas.

O coordenador do programa da Save the Cildren Reino Unido no Brasil adverte que o programa de combate ao trabalho infantil deve atender a um maior número de crianças em situação de trabalho. “Mas para isso temos que ter dados claros do que está acontecendo, não apenas a meta que se espera alcançar. É preciso garantir recursos que atendam a todas as crianças nesta situação”, afirma. O Ministério do Desenvolvimento Social deve atualizar o Mapa de Focos do Trabalho Infantil este ano, o que também estava previsto para 2008, mas não foi feito. Para o desenvolvimento desta ação estão previstos R$ 100 mil.

A concessão de bolsas para crianças e adolescentes em situação de trabalho, por sua vez, não vai sofrer alteração no número de pessoas atendidas. Em 2008 e em 2009, a previsão do MSD é beneficiar 177.054 infantes por ano. Mas o valor destinado à ação caiu 24% entre 2008 e 2009. No ano passado, a verba prevista para a ação esteve em R$ 41,7 milhões. Já este ano, o projeto conta com um orçamento de R$ 35,5 milhões.

Verba prevista em 2008 sofreu cortes

No decorrer do ano passado, a verba autorizada ao programa de combate ao trabalho infantil sofreu decréscimos, e passou de um orçamento inicial de R$ 335,8 milhões para R$ 280,7 milhões. Com isto, ao final de 2008, os desembolsos efetivos representaram 86% do valor disposto ao programa, ou seja, R$ 242,2 milhões aplicados nas ações, entre as quais há o encaminhamento de crianças para a rede de proteção social a fim de buscar a inclusão delas em programas de transferência de renda e a concessão de bolsas àqueles que tiveram violado o seu direito de não trabalhar (veja tabela).


Durante todo o ano de 2008, funcionários do MDS visitaram vários estados para fiscalizar o trabalho infantil, entre eles Sergipe, Alagoas e Paraíba, que estão entre as regiões com maiores focos de trabalho infantil. O nordeste concentra cerca de 1,9 milhão de crianças e adolescentes entre 5 e 17 anos em situação de trabalho. Os recursos do programa de Erradicação ao Trabalho Infantil também serviram para o transporte de agentes ao Maranhão. De acordo com o Sistema Integrado de Administração Financeira do governo federal (Siafi), foram desembolsados R$ 79,8 mil para arcar com os custos das diárias dos integrantes do programa que estiveram na região maranhense.

Trabalho infantil

De 2006 para 2007, segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o trabalho infantil caiu 0,7%. Entretanto, o país ainda tem o desafio de devolver a infância a milhares de pequenos brasileiros. Em 2006, 5,1 milhões de crianças e adolescentes entre 5 e 17 anos trabalhavam. Em 2007, o número caiu para 4,8 milhões, representando 10,8% do total de pessoas nesta faixa etária no país. Quase um terço dos que estavam nesta condição (30,5%) das crianças e adolescentes trabalhavam pelo menos 40 horas semanais. Já entre 5 e 13 anos, mais de 1,2 milhão de crianças e adolescentes trabalhavam no país em 2007, data no qual foi realizado o último levantamento do IBGE.

A diretora do Departamento de Proteção Social Especial do MDS reconhece que a queda é pequena, mas, segunda ela, é motivo de comemoração. “Todos os esforços da CONAETI [Comissão Nacional de Erradicação do Trabalho Infantil] são no sentido de reverter esse quadro. E, neste ano, continuaremos trabalhando para elaborar novas estratégias de combate ao trabalho infantil”, frisa. A CONAETI é coordenada pelo Ministério do Trabalho e Emprego, com participação de outros oito ministérios, inclusive o MDS, além de representantes do Fórum Nacional de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil e do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda).

Para Valéria Gonelli, o maior desafio no combate ao trabalho infantil está nas raízes culturais, pois a sociedade não debate a questão como deveria. “É preciso que as pessoas tenham mais consciência do que representa a infância. Deve haver um engajamento maior por parte dos conselhos tutelares também. No ano de 2009 nosso desafio será de continuar enfrentando mais fortemente o trabalho infantil, com novas estratégias e tentando, cada vez mais, incluir o tema em discussão”, antecipa. “Nesse sentido, muitos têm colaborado conosco como a Organização Internacional do Trabalho e o Fórum Nacional de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil”, aponta.

Integração PETI/Bolsa Família

A partir de 2006, com a ampliação do Cadastro Único do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, ocorreu a integração dos programas Bolsa Família e PETI. Com a integração, a maior parte dos recursos destinados ao PETI está alocada para co-financiar ações sócio-educativas e de convivência no contra-turno escolar nos municípios. Este ano, 86% do orçamento do programa, o que equivale a R$ 242 milhões, estão alocados na ação. Apesar da integração, a especificidade dos programas foi mantida, o que passou a ocorrer foi a potencialização das ações e a unificação das condicionalidades.

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