quinta-feira, 13 de novembro de 2008

Violência resulta de decadência das instituições, diz professor da USP

Fonte: Folha de São Paulo

Violência resulta de decadência das instituições, diz professor da USP

ROBERTO MADUREIRA
DA FOLHA RIBEIRÃO

O professor Sérgio Kodato, coordenador do Observatório da Violência e Práticas Exemplares da USP de Ribeirão Preto, afirma que, casos como o de ontem, decorrem da fragilidade do sistema pedagógico. "Grande parte dos alunos não vê sentido na escola. Para esses, a escola virou um grande clube, um local para amigos e paquera." Para ele, a sensação de impunidade nas escolas cria um clima de livre-arbítrio. "[Hoje] não se reprova nem por freqüência nem por nota. O professor não é avaliado. A escola não é avaliada. Leia trechos da entrevista à Folha.

FOLHA - Como o senhor vê o avanço da violência nas escolas públicas?
SÉRGIO KODATO
- A violência é fruto da decadência das instituições, principalmente das escolas públicas. As instituições são mecanismos civilizatórios criados para diminuir os conflitos sociais. E quando não cumprem seu papel, vem à tona uma carga de violência. Pesquisas indicam que um terço dos alunos não sabe o que faz na escola. Um grupo grande de alunos não vê sentido na escola. Para esses, a escola virou um clube, um local para esportes, amigos e paquera. Têm ainda aqueles que freqüentam a aula, mas estão "boiando". Os chamados analfabetos funcionais.

FOLHA - A imagem do professor também está desgastada?
KODATO
- Além da degradação da infra-estrutura das escolas públicas, houve também uma perda da autoridade da figura do professor e do diretor. Você pode ver que os alunos confrontam, batem nos professores e não se intimidam.

FOLHA - Existe uma sensação de impunidade nas escolas?
KODATO
- Hoje, mesmo que o aluno ponha fogo na escola, não acontece nada. No máximo uma transferência. Com a progressão continuada, isso piorou. Deixou a escola pública e o professor completamente sem mecanismos organizadores.
Não se reprova nem por freqüência nem por nota. O professor não é avaliado. A escola não é avaliada. Digamos que o professor entregou os pontos.
A sensação de impunidade cria um clima de livre-arbítrio, onde se pode tudo.

FOLHA - Qual o principal motivo dessa violência?
KODATO
- Percebemos que hoje não há só atos de vandalismo. São atos organizados, planejados, aquilo que na época de movimento estudantil chamávamos de união e organização. A maior vítima das escolas é o processo pedagógico. Perdendo ele, boa parte dos alunos se perde também.

FOLHA - Como a tecnologia pode ajudar a resolver o problema?
KODATO
- Em Serrana, no interior de São Paulo, temos um modelo de escola, com métodos modernos e lousas digitalizadas. Resultado: caiu bem a evasão escolar. Mas a escola pública no Brasil ainda funciona base do giz e da lousa.

FOLHA - Como é possível explicar um caso como o de hoje (ontem)?
KODATO
- Não se trata de simples vandalismo. São atitudes reativas, um grito contra o modelo que os incomoda. Para os alunos fazerem isso, deve ter tido um histórico de escola ruim, deteriorada e maltratada. É como uma rebelião, como nas "boas" épocas da Febem.

FOLHA - Como a escola deve lidar com alunos problemáticos?
KODATO
- A massa de trabalhadores que vê como expectativa de ascensão social a instrução do filho se sente frustrada com o descaso das autoridades com as escolas, que não oferecem perspectiva de futuro. Por isso, a educação de casa, geralmente, não inibe essa reação contra as escolas. Além disso, o Estado trata esses alunos que não conseguem acompanhar [o ensino] cada vez mais como vândalos.
Pensa que, se a família não os educa, também não tem a menor obrigação de fazê-lo. Os alunos passam a ser vistos como bandidinhos mesmo.

FOLHA - O senhor é a favor de medidas de segurança nas escolas?
KODATO
- Não adianta instalar porta giratória e câmeras. Além de não funcionar, vai colocar os alunos numa situação de prisão. O único jeito de resgatar a potência do professor é dar a ele essa tecnologia que foi desenvolvida. Precisaria de uma revolução nesses termos para acabar com essa violência.

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