quinta-feira, 18 de dezembro de 2008

Empresas sugerem suspensão do contrato de trabalho por 10 meses

Fonte: O Globo

SÃO PAULO, BRASÍLIA e RIO - Empresários e o Governo de São Paulo elaboraram estudo sugerindo a flexibilização de direitos trabalhistas, com mudanças na CLT. A proposta foi apresentada quarta-feira, em reunião do Conselho Deliberativo do Fundo de Amparo de Trabalho (Codefat), que liberaria parcelas extras do seguro-desemprego, e também foi encaminhada ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O objetivo é enfrentar a crise em 2009.

Eles defendem a possibilidade de suspensão temporária do contrato de trabalho pelo prazo máximo de dez meses. Após esse período, a empresa recontrataria os trabalhadores temporariamente afastados ou então promoveria a rescisão definitiva. Segundo a proposta, o trabalhador cujo contrato fosse suspenso teria direito a receber o benefício do seguro-desemprego

Na terça-feira, no entanto, o ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, descartou por completo adotar medidas que flexibilizem as leis trabalhistas para enfrentar este momento de crise.

A realidade, porém, é que trabalhadores já abrem mão de direitos para evitar demissões. Conforme mostrou reportagem publicada nesta quarta-feira pelo jornal O GLOBO, empresários e trabalhadores começam a fechar os primeiros acordos para flexibilizar direitos trabalhistas, dentro das possibilidades já permitidas por lei, para tentar amenizar os efeitos da crise financeira.

Estudo da Fundação Institutos de Pesquisas Econômicas (Fipe), feito a pedido da Secretaria do Emprego e Relações do Trabalho de São Paulo, avalia que o custo da medida seria de R$ 6 bilhões.

A proposta levada ao Codefat foi elaborada pela equipe do secretário do Emprego e Relações do Trabalho do governo paulista, Guilherme Afif Domingos, como medida de emergência "para atenuar o impacto da crise no emprego formal". A idéia é criar no país a suspensão temporária do contrato de trabalho (medida conhecida como layoff). Para tanto, seria necessária uma alternação na CLT (Consolidação das Leis do Trabalho), por meio de lei ordinária. A equipe sugere o uso de uma medida provisória (MP) para fazer as mudanças.

"A MP estabeleceria entre nós a figura da suspensão temporária do contrato de trabalho. Os trabalhadores seriam então temporariamente afastados, mas seu vínculo de emprego continuaria a existir. Não haveria para a empresa necessidade de desembolso de verbas rescisórias. O trabalhador cujo contrato fosse suspenso seria considerado tecnicamente como desempregado, teria direito a receber o benefício do seguro-desemprego", diz o texto do documento distribuído pelo governo paulista que detalha a medida.

A proposta sugere que a possibilidade de suspensão do contrato de trabalho seja instituída em caráter transitório, valendo apenas para o exercício de 2009. "Ao longo do ano, os impactos da criação do novo instituto seriam avaliados e as autoridades poderiam examinar a conveniência da sua manutenção para períodos subseqüentes", diz o texto.

A proposta prevê também que o trabalhador terá a possibilidade de participar de programas de treinamento específico ou de educação geral, com o objetivo de aprimorar sua qualificação para o trabalho enquanto seu contrato estiver suspenso. O setor público e as instituições privadas ofereceriam os recursos para a disponibilização dos programas de capacitação.

A mudança na lei trabalhista, segundo o estudo, com a ampliação do lay-off viria por meio de Medida Provisória. Hoje, o sistema existe, mas deve ser negociado entre sindicatos e empresas. Já o treinamento pode ser feito por apenas cinco meses, pelo Bolsa Qualificação.

A empresa que quiser utilizar a nova norma, obrigatoriamente terá de negociar com o sindicato dos trabalhadores. "A suspensão temporária do contrato de trabalho seria então introduzida por meio de um acordo coletivo, específico para a respectiva empresa. Não poderia ser instituída por meio de convenção coletiva", afirma o texto da proposta.

- A grande idéia é que isso não possa ser feito só pela empresa. Ela tem que chamar o sindicato e combinar com o sindicato. E nessa combinação uma das coisas que se pode exigir da empresa é que ela complemente o seguro-desemprego. A empresa pode ajudar também mantendo os benefícios, por exemplo o seguro-saúde, durante o tempo de afastamento. Pode ajudar dando um complemento de renda e, ainda assim, será um bom negócio para a empresa porque ela não tem que demitir e pagar todas as verbas rescisórias - opina o professor da Faculdade de Economia e Administração (FEA) da Universidade de São Paulo (USP), Hélio Zilberstein.

Força critica proposta. Para CUT, medida é válida para evitar demissão

O secretário-geral da União Geral dos Trabalhadores (UGT) e um dos conselheiros do Codefat, Francisco Canindé Pegado Nascimento, defende a medida para os casos em que não haja alternativa senão a demissão do trabalhador.

- Aquelas empresas atingidas pela crise econômica e que não teriam alternativa a não ser o desemprego do trabalhador continuariam a pagar os benefícios indiretos, os benefícios sociais. E o seguro-desemprego viria complementar então o salário do trabalhador, que estaria com o contrato suspenso - afirma.

Clemente Ganz Lúcio, diretor técnico do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) alerta para o risco de que o momento de crise seja utilizado como pretexto para a diminuição dos direitos trabalhistas.

- Nós não podemos fazer deste momento um momento para fazer mudanças na legislação que precarizem ou fragilizem as relações de trabalho. É aceitável, pelo bom senso, de que na crise nós tenhamos medidas emergenciais. O que nós não podemos fazer é que as medidas emergenciais virem o padrão das regras trabalhistas daqui para a frente.

Em nota à imprensa, a Força Sindical criticou a proposta do governo paulista e classificou a sugestão como falácia. "A proposta da Secretaria do Emprego e das Relações do Trabalho do Estado de São Paulo de criar um programa emergencial de seguro-desemprego para o período de crise é, na verdade, parte do discurso patronal de se aproveitar da crise internacional para retirar direitos dos trabalhadores. A proposta de suspender temporariamente o contrato de trabalho nas empresas em dificuldade, é uma falácia. Isso já consta na CLT por meio do Artigo 476-A, que já prevê a suspensão do contrato em situações emergenciais", diz o texto.

Mantega nega mudança

O presidente do Conselho Deliberativo do Fundo de Amparo ao Trabalhador (Codefat), Luiz Emediato, afirma que, a princípio, não há nenhuma proposta.

- Na verdade trata-se apenas de um estudo sugerindo ações que o Governo já executa, por determinação do Codefat. Emediato refere-se ao Bolsa-Qualificação.

O ministro da Fazenda, Guido Mantega, negou que o Governo pretende mudar a CLT.

- Apostamos, sim, nas negociações entre trabalhadores, patrões e sindicatos para impedir demissões - explicou.

Já fontes do Ministério do Trabalho informaram que, historicamente, o ministro Carlos Lupi é contra qualquer tipo de flexibilização de direitos.

Para o jurista Dalmo Dallari, a proposta é "profundamente cínica".

- Os empresários querem preservar privilégios retirando direitos dos trabalhadores.

Nenhum comentário:

Postar um comentário